Um dos importantes museus da cidade de São Leopoldo completou 45 anos no dia 26 de novembro. Sua fundação data de 1976 quando ocorreu um convênio entre a RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima) e o Museu Histórico Visconde de São Leopoldo. Já a linha férrea no Rio Grande do Sul teve seu início em 1871 ligando Porto Alegre a Novo Hamburgo quando foram importadas da Inglaterra duas estações idênticas, uma para Porto Alegre e outra erguida em São Leopoldo. Três anos depois, 14 de abril de 1874, é inaugurada, em São Leopoldo, a seção da estrada que fazia a ligação com Porto Alegre. Mais dois anos e a ligação até Novo Hamburgo estava concluída. O prédio que podemos visitar hoje é uma reconstrução realizada pelo PRESERVE, nos moldes da antiga estação de madeira.
Minha primeira coluna para este jornal comemorava o retorno de Alice Bemvenutti como diretora desta instituição. Na ocasião, entrevistei Alice e pude entender toda a complexidade que envolve a gestão do museu que abriga um acervo documental de importância ímpar, onde o gestor tem a responsabilidade não só de preservar todo este material, mas a de manter o espaço em funcionamento em condições adequadas para receber os visitantes com segurança, gerir a equipe, e fundamentalmente levar ao público o entendimento da importância deste acervo e do local como guardião da memória que constitui toda uma comunidade. Naquele ambiente se deu um trânsito que não favoreceu apenas a economia da cidade e do estado, mas a riqueza cultural, a formação de hábitos e costumes pela comunicação entre pessoas de lugares diversos. Alice tem mestrado em Museologia na USP e mantem tanto no doutorado (PUC RS), como na pesquisa (UNESP), seu foco na museologia e em especial no universo das ferrovias.
Para a comemoração dos 45 anos, Alice, sua equipe e a Secretaria de Cultura organizaram uma extensa programação que teve início no dia 22 de novembro, com Sessão Solene na Câmara dos Vereadores. Dia 24, transmitido pelo Facebook, aconteceu a 8ª Roda de Memória, encontro onde são reunidos integrantes do universo ferroviário, das comunidades e dos museus, para através de seus relatos, reavivar e preservar essas memórias. Dia 26 foi a abertura das exposições 1ª e 2ª Residência Artística com Lurdi Blauth e Rogério Severo respectivamente; exposição de fotografias Palcos Capilé de Giovani Paim e a mostra Candido Silveira organizada junto ao Departamento de Promoção de Igualdade Racial. Neste dia foi lançado o documentário 45 Anos do Museu do Trem com direção de Luís Vieira e Alice Bemvenutti que além de fazer um apanhado histórico mostrou como, mesmo em meio a uma pandemia, o museu manteve atividades utilizando os meios digitais. Foram realizadas inúmeras lives que proporcionaram um grande alcance de público e contatos com representantes dos demais museus ferroviários do país e até do exterior.
A programação para o último dia de comemorações envolvia Feira Econômica Solidária, Lojinha do Museu, Ato Solene de Aniversário, participação do Grupo Corpos & Sombras, Bazar Divino Maravilhoso, Caminhada do Trem com percurso pelo centro histórico e Rota Romântica, atrações musicais, oficinas de arte com Klau Brentano, mediação cênica A história do museu por um maquinista com Totonho Lisboa, Teatro de bonecos com Arquibaldo (Mico Leão) e um novo personagem Maquinista, com Fantomania, bolhas de sabão gigante, picnic e Blitz de Vacinação.
Esta tarde de sábado contou com a presença de Daggi Dornelles apresentando o passar em branco - poemas urbanos. Trata-se de um trabalho que é resultado de uma pesquisa de anos onde a artista investiga a relação corpo, tempo, movimento e espaço. Conforme Daggi “o passar em branco – poemas urbanos é um ato de passagem pela cidade, onde o encontro entre corpos, sob a mediação de tecidos brancos, tomados como pele do corpo urbano, busca um alívio do endurecimento do tempo/espaço/corpo da urbanidade. Quase um anti-espetáculo, quase uma fuga do foco, apenas a escuta e um cochichar que move, emanando dos poros da urbanidade!”
Essa relação com o entorno também é o espírito da proposta de residências no Museu, Residência Artística e Residência Museu-Escola. Esta última, a Museu-Escola, é uma parceria entre Secretaria de Cultura e Relações Internacionais e Secretaria da Educação de São Leopoldo visando estimular a pesquisa e explorar o patrimônio da cidade que poderá se transformar em trabalhos para serem apresentados na Mostra de Tecnologia e Inovação com Ciências, a MOTIC e está aberta a professores e professoras municipais das disciplinas de História, Geografia, Arte e demais interessados.
Já a Residência Artística Museu do Trem, como diz o nome, é voltada aos artistas que queiram realizar um diálogo com o museu, explorando o acervo e todo o sítio histórico de forma a gerar desdobramentos a partir do olhar de cada criador sobre esse patrimônio. A proposta para uma residência nunca será constituída de um projeto fechado, pois é justamente a partir do tempo em que o artista permanecer no museu, pesquisando o acervo, o sítio e o entorno, que se constituirá o trabalho.
Dentro dessa premissa Lurdi Blauth realizou a Primeira Residência Híbrida no Museu do Trem, que resultou numa série de gravuras e uma mostra intitulada Pare | Escute | Olhe. Híbrida porque se deu no período da pandemia e desta forma, tomando todos os cuidados, Lurdi visitou o acervo documental, revisitou os objetos expostos, o sítio com as locomotivas, e até mesmo suas próprias lembranças daquele lugar. A partir dos registros e impressões colhidas, realizou o trabalho em seu atelier de gravura. Hibrido também porque num primeiro momento as obras e o vídeo realizado, o qual tive a honra de editar, foram apresentados virtualmente acompanhado de conversas com a artista em mais de uma live.
Lurdi utilizou a técnica de xilogravura e litografia poliéster, que é um processo alternativo sem o uso de produtos químicos. Na exposição que acontece agora em um dos vagões do museu, a artista apresenta também algumas das matrizes utilizadas para as xilogravuras. O Vídeo PARE | ESCUTE | OLHE pode ser visto no Instagram lurdiblauth e no site www.lurdiblauth.com.br
A Segunda Residência Artística Museu do Trem foi realizada por Rogério Severo e resultou na instalação intitulada Linha de Ferro.
Rogério trabalha com tensão entre linhas, pesos de ferro, nós de cordas, fitas serra, morsas e outros elementos, criando arcos e linhas retas que geram um tensionamento em todo o espaço circundante. Seu trabalho pode ser interpretado como desenhos no ar que estão em constante diálogo com as linhas e planos do local onde a instalação foi criada. Na verdade, ela surge deste diálogo quando elementos totalmente estranhos vão sendo incorporado à paisagem e provocam outras questões e outras respostas. Assim Linha de Ferro foi se constituindo. Cada esforço no sentido de movimentar e equilibrar as grandes estruturas, trazia consigo uma nova reflexão sobre os aspectos mais elementares do que seja estar no mundo.
Linha de Ferro dá título ao vídeo, que também tive a honra, neste caso de filmar e editar, e que terá um desdobramento incorporando outras ações que serão realizadas durante o período de exposição. Este vídeo pode ser encontrado em www.rogeriosevero.com.br no link Vídeos.
Palcos Capilé – Mostra fotográfica de Giovani Paim
Não deixe de visitar estas exposições e todo o acervo deste museu que é da comunidade de São Leopoldo, o Museu do Trem.
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